sexta-feira, 25 de maio de 2012

cacimbas

EM BUSCA DE ÁGUA NO SERTÃO DO NORDESTE Nilton de Brito Cavalcanti, Luiza Teixeira de Lima Brito, Geraldo Milanez de Resende. Pesquisadores da Embrapa Semi-Árido. C. Postal 23, 56302-970 Petrolina-PE. E-mail: nbrito@cpatsa.embrapa.br Resumo - Nos sertões do Nordeste brasileiro, a água é o principal obstáculo para a sobrevivência dos agricultores e animais. A vulnerabilidade a que estão expostas as populações rurais, em decorrência da instabilidade climática, é dramatizada pelos períodos de seca que ocorrem, em média, a cada cinco anos. Este trabalho teve como objetivo fazer um levantamento com os agricultores de três comunidades da região semi-árida do município de Petrolina-PE, quanto à existência de cisternas rurais para captação e acumulação de água em suas residências no ano de 2002. Foram acompanhadas 48 famílias no período de janeiro a dezembro de 2002. Desse total, 35 possuem cisternas rurais em suas residências. Em uma comunidade, não foi encontrada nenhuma cisterna rural. Com esses resultados, pode-se concluir que as ações governamentais implementadas na região semi-árida do Nordeste, via programas de construção de cisternas rurais e outras fontes de captação e acumulação de água, embora tenham contribuído, em parte, para o alívio das populações rurais atendidas por esses programas, ainda não foram suficientes para a grande transformação da região, que é a convivência com a seca, pois a cada novo período de estiagem que ocorre na região, as calamidades provocadas pela seca voltam a trazer transtornos para os habitantes do semiárido. Palavras-chave: água, cisternas, semi-árido. Introdução Nos sertões do Nordeste brasileiro, a falta de água é o principal obstáculo para a sobrevivência dos agricultores e animais. A vulnerabilidade a que está exposta esta região é decorrência da instabilidade climática, dramatizada pelos períodos de seca que ocorrem, em média, a cada cinco anos (CRUZ et. al., 1999). As secas mais recentes foram responsáveis pela redução de 9% no produto da agropecuária regional e de 4,5% no PIB, com uma população atingida na ordem de 12 milhões de habitantes, dos quais, 2 milhões foram inscritos nas frentes de emergências de trabalho (CRUZ et. al., 1999). Todavia, a busca de soluções para essas calamidades remota ao século 19, quando em 1845 o Imperador D. Pedro II deu início às primeiras iniciativas locais de combate às secas implementadas pelo Estado. Com a criação em 1909 da Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS), transformada depois no Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), teve início um programa de combate às secas, cujo objetivo principal foi a acumulação de águas por meio da açudagem e das obras de infra-estrutura com duração de 1909 a 1945 (GARRIDO, 1999). Vários programas vieram complementar as ações da IOCS e do DNOCS, tais como, a Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), a SUDENE, o Projeto Sertanejo, entre outros. Contudo, os problemas da seca continuaram a trazer graves calamidades à população do Nordeste semi-árido. Embora, nos últimos anos, nesta região tenham ocorrido transformações sem precedentes - intensiva urbanização, desenvolvimento da infra-estrutura e expansão da irrigação no Vale do São Francisco, no oeste da Bahia e no Rio Grande do Norte - os sertanejos estão ainda mais vulneráveis, frente aos efeitos das secas, pois vivem num ambiente ecologicamente empobrecido, incapaz de oferecer recursos alternativos à escassez de água e alimentos, à margem das ilhas de modernidade do semi-árido (MIRANDA, 2002). Recentemente, foi criado o Programa de Mobilização Social para Construção de 1 Milhão de Cisternas (P1MC), com a participação das comunidades na busca de soluções para a falta de água no sertão (CÁRITAS BRASILEIRA, 2001). Este trabalho teve como objetivo fazer um levantamento junto aos agricultores de três comunidades da região semi-árida do município de Petrolina-PE, quanto à existência de cisternas para captação e acumulação de água em suas residências. Metodologia Para a realização desse estudo, foram selecionadas, ao acaso, três comunidades da região semi-árida do município de Petrolina-PE, sendo as comunidades de Jatobá da Cumprida, com 17 famílias, Cacimba do Bonfim, com 23 famílias, e Budim, com 8 famílias. O trabalho foi realizado no período de janeiro a dezembro de 2002. Após a seleção das comunidades, foi realizado um levantamento nas comunidades junto a cada família para identificação da existência de cisternas rurais em suas residências e das fontes de água utilizadas pelos agricultores. Foram realizadas visitas mensais às comunidades para o acompanhamento da captação e acumulação de água nas cisternas, barreiros e cacimbas, como também, das cisternas e residências abastecidas por carros-pipa. Resultados e Discussão As ações governamentais implementadas na região semi-árida do Nordeste, via programas de construção de cisternas rurais e outras fontes de captação e acumulação de água, embora tenham contribuído, em parte, para amenizar os problemas da falta de água para consumo das populações rurais atendidas por esses programas, ainda não foram suficientes para promover transformações na região, que é a convivência com a seca, pois a cada novo período de estiagem que ocorre na região, as calamidades provocadas pelas secas voltam a trazer transtornos para os seus habitantes. Na comunidade de Jatobá da Cumprida, foram acompanhadas 17 famílias em 2002. Nessa comunidade, 12 famílias possuem cisternas em suas residências para captação e armazenamento de água de chuva. Dessas cisternas, 5 são do tipo tanque (Cisterna de tijolo) e 7 de placas, construídas pela Prefeitura Municipal e pelo programa P1MC. As cisternas de placas existentes na comunidade têm capacidade para 16.000 litros cada, enquanto as cisternas tipo tanque têm capacidade média de 6.500 litros. Há diversos tipos de cisternas que podem ser construídas pelos agricultores, como cisterna de placas de cimento, cisternas de tela-cimento, cisternas de tijolos, cisternas de ferro cimento, cisternas de cal e cisternas de plástico (GNADLINGER, 1999). Contudo, as cisternas rurais construídas pelos agricultores, sem a participação de programas governamentais, geralmente são de tijolos e, algumas vezes, mais caras que uma cisterna de placa que pode ser construída para a acumulação de 10.000 litros de água por R$ 219,00 (GNADLINGER, 1999). Das 17 famílias da comunidade, 5 não tinham cisternas em suas residências, até o final de dezembro de 2002. A água consumida por essas famílias foi obtida de cacimbas, barreiros e carros-pipa. Com as chuvas que ocorreram no mês de janeiro de 2002, num período de 16 dias, as cisternas conseguiram acumular uma quantidade de água que amenizou a estiagem que se prolongou do mês de maio ao final do mês de dezembro. Contudo, parte da água consumida pelas famílias nos últimos meses do ano foi obtida de carro-pipa fornecido pela Prefeitura Municipal e outras vezes adquirida ao preço de R$ 60,00 por carro-pipa. Para as famílias que não tinham cisternas, durante todo o ano, a água foi obtida de cacimbas, barreiros e carrospipa. Na Figura 1, pode-se observar uma cisterna tipo placas, utilizada pelos agricultores da comunidade de Jatobá da Cumprida. Embora as chuvas tenham sido importantes, parte da água não foi captada, pois, aproximadamente, 41,66% das residências com cisternas não têm calhas para condução da água da área de captação, na maioria o telhado das casas, até seu interior. Para essas famílias, a cisterna teve como função, em 2002, acumular água fornecida por carro-pipa. Figura 1. Cisterna tipo placas utilizada pelos agricultores da comunidade de Jatobá da Cumprida, Petrolina-PE. Na comunidade de Cacimba do Bonfim, foram acompanhadas 23 famílias no ano de 2002. Nessa comunidade, foram encontradas 25 cisternas de placa construídas pela Prefeitura Municipal e pelo programa P1MC. Dessas cisternas, duas foram construídas em propriedades onde ainda não existe uma residência com família para utilização da água (Figura 2). Essa ocorrência contraria os fundamentos do programa P1MC, cujos objetivos são a construção de cisternas em residências sem reservatórios e com pessoas. Na comunidade, existem também duas cisternas em residências que foram desocupadas pelas famílias (Figura 3). As chuvas que ocorreram em janeiro de 2002 nessa comunidade possibilitaram o acúmulo de uma quantidade razoável de água nas cisternas. Nessa comunidade, 26,08% das residências não têm calhas para condução da água dos telhados para o interior das cisternas (Figura 4). Todavia, nos meses de outubro, novembro e dezembro, parte da água utilizada pelos agricultores foi obtida de carros-pipa, barreiros e cacimbas. Figura 2. Cisterna construída em área sem residência na comunidade de Cacimba do Bonfim, Petrolina-PE. Figura 3. Cisterna em residência sem família na comunidade de Cacimba do Bonfim, Petrolina-PE. Figura 4. Residência com cisterna sem calhas para captação e condução de água na comunidade de Cacimba do Bonfim, Petrolina-PE. Na comunidade de Budim foram acompanhadas 8 famílias no ano de 2002. No mês de janeiro de 2002, as chuvas se concentraram num período de 15 dias, o que proporcionou o acúmulo de bastante água nos barreiros da comunidade. Nessa comunidade, não existe nenhuma cisterna nas residências dos agricultores. A água para o consumo doméstico é proveniente de carros-pipa, barreiros e cacimbas. Nas residências, a principal forma de armazenamento da água é em tambores de ferro ou em bombonas de plástico. Estes recipientes, muitas vezes, são impróprios para utilização no transporte e armazenamento de água, devido ao fato de que possam ter sido usados para o transporte de produtos químicos. A situação na comunidade de Budim demonstra, em parte, que as ações governamentais para convivência com a seca não têm alcançado seus reais objetivos, face a decisões políticas que muitas vezes não consideram as necessidades dos agricultores. Segundo LIBERAL e PORTO (1999), no ano de 1995 foram construídas 1.000 cisternas de placas pré-moldadas no município de Petrolina, sendo, até o momento, considerado como o maior programa de construção de cisternas executado por um governo municipal no Nordeste brasileiro. Todavia, esse programa não atendeu a algumas comunidades que ainda continuam sofrendo por falta de água para suas necessidades básicas. Quando encontramos cisternas em residências abandonadas e em locais sem residências, acreditamos que não existem mais famílias sem cisternas no município. Todavia, a comunidade de Budim continua à espera de soluções para a questão da busca pela água para sua sobrevivência. Na Figuras 5, pode-se observar uma residência da comunidade de Budim sem cisterna. Figura 5. Casa sem cisterna na comunidade de Budim, Petrolina-PE. Conclusões As ações governamentais implementadas na região semi-árida do Nordeste, via programas de construção de cisternas rurais e outras fontes de captação e acumulação de água, embora tenham contribuído, em parte, para o alívio das populações rurais atendidas por esses programas, ainda não foram suficientes para a grande transformação da região, que é a convivência com a seca, pois a cada novo período de estiagem que ocorre, as calamidades provocadas pela seca voltam a trazer transtornos para seus habitantes. As decisões políticas que têm norteado o programa de cisternas rurais no município de Petrolina não foram suficientes para o atendimento de toda a população que necessita de cisternas para a captação e o armazenamento de água de chuvas. Há necessidade de rever os critérios adotados de escolha das famílias a serem contempladas com as cisternas. Referências Bibliográficas CÁRITAS BRASILEIRA. Água de chuva: o segredo da convivência com o Semi-Árido brasileiro. Cáritas Brasileira, Comissão Pastoral da Terra, Fian/Brasil – São Paulo: Paulinas, 2001. il. 104p. CRUZ, P. H. COIMBRA, R. M., FREITAS, M. A. V. Vulnerabilidade climática e recursos hídricos no Nordeste. In.: O ESTADO DAS ÁGUAS NO BRASIL/ org. Marcos Aurélio Vasconcelos de Freitas – Brasília, DF: ANEEL, SIH; MMH, SRH; MME, 1999. 334p. GARRIDO, R. J. O combate à seca e a gestão dos recursos hídricos no Brasil. In.: O estado das águas no Brasil/org. Marcos Aurélio Vasconcelos de Freitas – Brasília, DF: ANEEL, SIH; MMA, SRH; MME, 1999. 334p. GNADLINGER, J. Apresentação técnica de diferentes tipos de cisternas construídas em comunidades rurais do semi-árido brasileiro. In.: SIMPÓSIO SOBRE CAPTAÇÃO DE ÁGUA DE CHUVA NO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO, 1., 1997, Petrolina, PE. A captação de água de chuva: a base para viabilização do semi-árido brasileiro. Anais... Petrolina, PE: Embrapa Semi-árido/IRPAA/IRCSA, 1999. 186p. il. LIBERAL, G. S.; PORTO, E. R. A situação atual de cisternas rurais construídas por programas governamentais. In.: SIMPÓSIO SOBRE CAPTAÇÃO DE ÁGUA DE CHUVA NO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO, 1., 1997, Petrolina, PE. A captação de água de chuva: a base para viabilização do semi-árido brasileiro. Anais... Petrolina, PE: Embrapa Semiárido/ IRPAA/IRCSA, 1999. 186p. il. MIRANDA, E. E. O sertão vai virar pasto. Jornal da Ciência, 27 de agosto de 2002. copyright autor do texto

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